Quadrilhas africanas que operam no Brasil estão enviando drogas de forma sistemática para a Espanha, a China e o Reino Unido por meio de serviços postais. A Polícia Federal faz cerca de 50 apreensões por mês dessas remessas. A maioria é de cocaína.
Para tentar enganar a polícia e a Receita Federal, os traficantes usam esconderijos inusitados para esconder a droga. Entre as técnicas já identificadas estão rechear com pequenas quantidades de cocaína objetos como brinquedos, roupas, ferramentas e utensílios domésticos - e depois enviá-los ao exterior por meio do correio e de empresas de entregas internacionais.
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Segundo o delegado Ivo Roberto Costa da Silva, da Polícia Federal, os grupos criminosos são formados majoritariamente por nigerianos. "Eles não chegam a formar uma facção ou uma máfia, mas às vezes se associam para traficar", afirmou o policial.
Os destinos preferidos para as remessas são Espanha e, em menor escala, China e Reino Unido. Segundo Silva, as quadrilhas de africanos também têm ramificações nesses países. Seus membros se encarregam de receber os entorpecentes.
O crescimento do narcotráfico para a China, especificamente, tem chamando a atenção das autoridades. O país pulou do quinto lugar no ranking em 2009 para segundo em 2012. Uma hipótese investigada é de que o crescimento econômico chinês tenha estimulado também o tráfico de drogas.
De acordo com o policial, alguns motivos explicam por que quadrilhas africanas se instalaram no Brasil. Um deles é a grande fronteira com países onde há produção de cocaína (Colômbia, Bolívia e Peru). Outro fator de estímulo seria o Brasil possuir grande número de voos de passageiros e de carga para a Europa.
Apreensões
Em 2012, a Receita e a Polícia Federal apreenderam mais de 140 quilos de cocaína em cerca de 580 remessas ilegais por meio de serviços postais no Brasil. O número representa uma queda de 35% em relação à quantidade de drogas apreendidas em 2009 - o ano em que essa modalidade de tráfico passou a ser combatida de forma mais intensa.
Na opinião de Hugo Garcia, chefe do Serviço de Remessas Postais Internacionais, da Receita Federal, a diminuição da quantidade de apreensões seria um reflexo do combate feito pelas autoridades brasileiras a esse tipo de narcotráfico. "Hoje 100% dos pacotes (enviados ao exterior) são examinados em um aparelho de raio X. Alguns também são submetidos a um cão de faro", disse Garcia.
O raio X é semelhante ao utilizado em aeroportos. Sem ter de abrir os pacotes, as autoridades conseguem identificar substâncias suspeitas de serem entorpecentes. As remessas são então submetidas à análise de cães treinados para detectar cocaína pelo odor e abertas por agentes.
Segundo o delegado Silva, a alta taxa de apreensões no correio faria com que as quadrilhas africanas se concentrassem em outra modalidade de tráfico internacional: o aliciamento de "mulas" - viajantes recrutados para engolir pacotes de cocaína e embarcar em voos para a Europa e para a África. De acordo com a Polícia Federal, mais de uma tonelada de cocaína foi apreendida no ano passado só no aeroporto de Cumbica, em São Paulo.
Investigações
Segundo autoridades, os serviços postais são largamente usados por traficantes internacionais por oferecer a eles uma suposta sensação de segurança. Mas, quando um pacote com drogas é encontrado pela Receita Federal, segundo Garcia, começa um trabalho de investigação policial.
Ele envolve o rastreamento da agência onde a remessa foi enviada e até a busca por impressões digitais do traficante. Em 2012, a Polícia Federal prendeu 12 membros das quadrilhas de origem africana operando no Brasil.
No entanto, segundo Silva, a resistência de autoridades de outros países em colaborar com as investigações tem prejudicado as operações da Polícia Federal. De acordo com ele, uma parte importante da investigação é permitir que remessas suspeitas entrem de forma controlada em seus países de destino - com o objetivo de identificar quem são os receptadores.
Contudo, autoridades da Espanha e de alguns países europeus não teriam cooperado em ações dessa natureza. Uma exceção é o Reino Unido, segundo Silva, onde ao menos duas operações do gênero foram realizadas.