Raphael Gomide
Dados da Defesa Civil do Rio de Janeiro mostram que é muito baixa a adesão a pontos de apoio, em chuvas reais. Sistema de alertas é tido como uma das principais ações na prevenção de deslizamentosApontado como uma das principais ações na prevenção de escorregamentos em áreas de risco, o sistema de alerta e alarme de sirenes não tem sido eficiente em seu propósito, a evacuação. Levantamentos da própria Subsecretaria de Defesa Civil Municipal do Rio de Janeiro revelam que menos de 10% dos moradores dessas regiões atendem ao alerta das sirenes e saem das casas ameaçadas, em direção aos pontos de apoio.
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Na noite desta terça-feira, o município informou que sirenes foram disparadas em seis comunidades da Tijuca (zona norte).
Uma planilha da Defesa Civil Municipal da Prefeitura, à qual o iG teve acesso, mostra que, em 11 comunidades da zona norte (Borel, Formiga, Chacrinha, e Macacos, entre outras), apenas 5,9% dos moradores, em média, dirigiram-se aos pontos de apoio estabelecidos pela prefeitura, no temporal de 25 de abril de 2011. A maior adesão foi no Morro da Formiga, onde 180 (14,7%) das 1221 se dirigiram ao ponto de encontro; o pior desempenho foi na Cotia (Lins dos Vasconcelos), onde apenas 10 pessoas de 693 (1,4%) se apresentaram.
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No Sítio Pai João, no Itanhangá, em março de 2012, o resultado foi um pouco melhor, mas não tanto: só 19,6% dos moradores foram ao ponto de apoio.
Subsecretário de Defesa Civil reconhece que adesão é baixa
O subsecretário de Defesa Civil, tenente-coronel bombeiro Márcio Motta, afirmou que a chuva de 2011 foi antes de julho daquele ano, quando houve o primeiro exercício de simulação, quatro meses após a instalação das sirenes, em janeiro. Disse ainda que em 25 de abril de 2012, houve 11 deslizamentos, mas todas as casas estavam desabitadas. “Não houve nenhum dano humano, mortos ou feridos. Nosso principal objetivo é salvar vidas e nisso o sistema de alertas tem sido muito eficiente”, afirmou.
Márcio Motta reconheceu que esses casos não foram os únicos em que a adesão foi baixa. Em ao menos duas outras ocasiões, também em 2012, a adesão ficou em torno dos 10%: na Rocinha, em junho, e na Nova Maracá, em Tomás Coelho (zona norte). Ele não citou nenhum caso específico em que a adesão tenha sido relevante.
Mais populosa favela do Brasil, segundo o IBGE, Rocinha é também a comunidade na cidade com o maior número de moradias em áreas de alto risco, 1655 (ou 5.461 pessoas). O iG mostrou nesta quarta-feira, que há 95 mil pessoas em áreas de alto e médio risco no Rio.
De acordo com Motta, nesse dia de chuvas na Rocinha, em junho de 2012, havia nove viaturas e cerca de 30 agentes da Defesa Civil Municipal na comunidade, mas só cerca de 10% das pessoas foram ao “ponto de apoio”. Segundo ele, a presença da Defesa Civil no local, por vezes, dá uma “sensação de segurança” aos moradores. Outro possível motivo para a pouca adesão, diz, foi a final de futebol nas Olimpíadas de Londres, no dia, entre Brasil e México. “Nossa presença por vezes dá uma ‘sensação de segurança’ e de ‘vou esperar acontecer’. Felizmente não houve deslizamento. Precisamos amadurecer e evoluir muito. Preciso e estamos trabalhando para ter o cidadão preparado”, afirmou.
Na Nova Maracá, ele também admitiu que “era dia da semana, e a adesão foi de mais ou menos 10%. Mas não tivemos nenhum dano humano.”
Na opinião do subsecretário, leva tempo para as pessoas se acostumarem ao procedimento, apesar de a Defesa Civil já ter feito 14 simulações de evacuação no município – com adesão de 63% a 100%, segundo ele. “Não havia sirene antes. Foi novo para a prefeitura, o que dirá para as pessoas comuns. Infelizmente, muitos já estão acostumados ao risco inerente, e não à prevenção. A sirene é para prevenir que algo grave aconteça. Elas se confortam com a visita da Defesa Civil. É uma questão cultural.”
A planilha é a única anexada a ações civis públicas do Ministério Público do Estado, que pede obras emergenciais de prevenção de escorregamentos. Como o iG revelou, a Prefeitura e o Estado recorreram contra 13 liminares que determinavam as obras. O presidente do TJ, Manoel Alberto Rebêlo dos Santos, suspendeu de uma só vez, em bloco, as liminares.
Sistema de alertas é insuficiente, diz promotor de Justiça
Para Carlos Frederico Saturnino, da Promotoria do Meio Ambiente, esses dados revelam que o sistema de alerta e sirenes “é uma medida paliativa necessária, porém de efetividade insuficiente se não forem feitas as obras de contenção e redução do risco em tempo hábil. Jamais pode ser considerado uma solução definitiva ou mesmo duradoura”.
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Na opinião dele, “no Rio, o risco decorre principalmente da omissão do Poder Público”. “Primeiro, por permitir construções em locais arriscados, sobretudo encostas e margens dos rios, quase sempre por ausência de políticas habitacionais, de transporte público e fiscalização urbanística. Segundo, por protelar a execução das obras necessárias para reduzir o risco a padrões normais, nas áreas mais perigosas. Esta omissão não pode ser considerada sanada com a instalação de sirenes nas favelas. Sirenes não diminuem o risco, apenas avisam com poucos minutos de antecedência q o risco pode se consumar de forma trágica”, disse.
“Eliminar o risco é impossível, porque sempre pode ocorrer algo absolutamente imprevisível. Mas não é disso que tratamos. As áreas de risco foram mapeadas. Portanto, o risco nestas áreas não apenas é previsível como foi cientificamente previsto a tempo de ser evitado, e não somente alertado por sirenes”, afirmou o promotor.
O subsecretário Motta disse que a cidade do Rio tem 103 comunidades com sirenes, mais que a soma de quatro municípios da Região Serrana, que, juntos, contam com 82. Ele afirmou que a prefeitura capacitou 4.800 agentes comunitários de saúde para essas situações e vai começar em 40 escolas com um projeto de Defesa Civil.
Motta citou ainda o acordo com as operadoras de telefonia móvel para atuar na prevenção, que já cadastrou 40 mil pessoas para receber alertas. Para se cadastrar, é preciso mandar um SMS (para o número 4.000 e o texto “DCRJ” na Oi, Vivo e Tim, e para o 889 na Claro).